Wicca
x Candomblé
(Por
Claudiney Prieto)
O Brasil
é um país fortemente místico, onde crenças se misturam e
religiões se sincretizam entre si.
A
religiosidade afro-brasileira é muito forte e tradicional em todo o
nosso país, enquanto a Wicca é uma nova religião que vem chegando
por aqui, mas mesmo assim ganha mais espaço a cada dia e
consequentemente maior número de praticantes.
A Wicca
possui muitas semelhanças com o Candomblé, no que concerne ao culto
à antigos Deuses, conexão com as forças da natureza, etc. Sendo
asssim, muitos dos novos Wiccanianos são antigos praticantes da
Umbanda e Candomblé que sentiram que tais religiões não respondiam
mais aos seus anseios.
Exatamente
por causa disso, ou por pura falta de informação, é muito comum
vermos estas pessoas fazendo uma fusão entre as duas religiões, o
que é impossível!
A Wicca é
uma religião que possui liturgia e estrutura próprias e por isso
não precisa se reportar ou absorver aspectos de nenhuma outra
religião.
Enquanto
é possível usar Deuses africanos num ritual Wiccaniano, é
completamente inviável fazer um mix entre Candomblé e Wicca, do
mesmo jeito que é impossível misturar Islamismo e Xintoismo.
Mas
por que é impossível praticar Wicca e Candomblé ao mesmo tempo?
Para
compreendermos isso precisamos conhecer um pouco mais dessas duas
religiões.
Sobre
os deuses africanos:
Quem são
os Deuses Africanos?
Os
Orixás, são divindades originárias da África, mais
especificamente Nigéria e que vieram para o Brasil junto com os
africanos para cá deportados como escravos. Os orixás representam
as forças da natureza ou os fenômenos a ela relacionados.
Muitos
pesquisadores afirmam que na realidade os Oríxás são ancestrais
míticos, ou seja, seres humanos que teriam realizados feitos
incríveis na Terra e por isso deificado pelo seu clã, família ou
povo.
Quando os
africanos desembarcaram no Brasil encontraram uma nova realidade, um
novo continente e tiveram que adaptar muitas de suas práticas e
então a Religião dos Orixás assumiu um novo nome: Candomblé, uma
religiosidade essencialmente brasileira, resultante da realidade
religiosa africana no Brasil.
Dos mais
de 400 Orixás existentes na África somente o culto a 16 deles
sobreviveu no Brasil. Muitos dos mitos relacionados a estas 16
divindades sobreviventes foram deturpados, muitos deles absorveram
inúmeros aspectos de outros Deuses cujo culto não sobreviveu no
Novo Mundo, etc.
Ou seja,
o candomblé é nada mais que uma reconstrução da religiosidade
Nigeriana dos Orixás.
Sobre
o Candomblé:
O que
o Candomblé tem em comum com a Wicca???
Muitas
coisas, mas é necessário deixar bem claro que ter coisas em comum
não significa de nenhuma forma "ser a mesma coisa":
*
Culto Circular:
Os
rituais do Candomblé são sempre realizados através de uma dança
Circular. Eles invocam seus Deuses dançando em Círculo. Os Círculos
sempre foram considerados os símbolos da ponte que nos leva à
Divindade, símbolos da comunhão com os Deuses.
Os
rituais Wiccanianos ocorrem dentro de um Círculo Mágico e também
dançamos em Círculo para reverenciar nossos Deuses.
*
Religiosidade iniciática:
Tanto o
Candomblé quanto à Wicca são religiões iniciáticas. Nelas, seus
adeptos passam por treinamentos e ritos de passagem que os introduzem
no seio de suas comunidades religiosas. Tanto em uma outra, depois de
um determinado tempo os iniciados pasam a ser considerados
sacerdotisas e sacerdotes do culto no qual foram iniciados. Uma
semelhança existente entre as duas religiões é que quando uma
pessoa passa a pertencer à classe sacerdotal ela ganha um título
que a diferencia das demais pessoas. Na Wicca após determinados anos
o iniciado recebe o título de Elder(Ancião). No candomblé depois
de alguns anos de iniciado a pessoa recebe o título de
Egbonmi(significando literalmente irmão mais velho). Tanto na Wicca
quanto no Candomblé, a partir deste momento a pessoa passa a ser
ouvida, consultada e instrui outros no caminho.
*
Oferendas aos seus Deuses:
Tanto na
Wicca quanto no Candomblé os Deuses são agradados através de
oferendas. Infelizmente no Brasil muitos Wiccanianos perderam o
hábito de fazer oferendas à Deusa e ao Deus, mas está é uma
prática integrante da religiosidade Wiccaniana em todo mundo.
*
Analogias para estabelecer comunicação com os Deuses:
No
candomblé existem determinados fatores como ervas, aromas, cores,
dias, horas, locais favoráveis ou desfavoráveis para acessar
determinados tipos de energias e Deuses. O mesmo acontece na Wicca.
*
Deuses da natureza
Tanto na
Wicca quanto no Candomblé os Deuses são vistos como a própria
natureza deificada.
O que
o Candomblé NÃO tem em comum com a Wicca:
*
Falta de respeito à natureza
Mesmo
sendo uma religiosidade com Deuses da natureza, no candomblé vemos
que há uma total falta de respeito à natureza na medida em que seus
adeptos muitas vezes poluem-na com suas oferendas. Infelizmente os
adeptos do camdomblé passaram a ver seus Deuses de forma muito
semelhante à religiosidade judaico-cristã, seres conceituais que
exercem domínio sobre a natureza mas não são imanentes
*
Hierarquia.
Enquanto
a Wicca é uma religião sem hierarquia pré-estabelecida, o
candomblé possui uma estrutura hierarquica inabalável e vista como
vital para a sua religiosidade
*Sacrifícios
Na Wicca
sacrifícios animais são inadimissíveis enquanto a base da religião
do Candomblé está no sacrifício animal. Sacrifício (Sacro Ofício)
do Candomblé não é uma carneficina como muitos querem fazer
parecer. Ele possui sua razão de ser dentro daquela religião. Muito
contrário do que o pensado, todos os animais sacrificados servem de
alimentos para os adeptos do Candomblé. Nenhuma parte, nem mesmo os
ossos dos animais, são desperdiçadas. Pensando friamente e sem
fazer apologias aos sacrifícios, talvez seja muito mais ético
sacrificar um animal à um Deus, com ritos e reverências a alma do
animal que se doa para alimentar e nutrir outros seres, do que
comprar um frango congelado no supermercado, que cresceu a base de
hormônios e foi morto sem nenhuma honra ou respeito.
Bom,
estas são apenas algumas das semelhanças e diferenças.
Deuses
africanos na Wicca:
Hoje no
mundo inteiro, divindades de diferentes panteões são cultuadas na
Wicca.
Existem
inúmeras tradições que trabalham com Deuses que vão desde o
panteão egípcio até chinês, enquanto outras trabalham com um
único panteão todo o tempo. Tudo varia de acordo com a Tradição
que se segue.
Não é
impossível trabalhar com Deuses Africanos na Arte, desde que isso
seja aceito por sua Tradição e eles sejam inseridos em um contexto
de culto Wiccaniano.
O que
ocorre aqui é que nos encontramos em um dilema do entendimento da
Religião Wicca e somente o bom senso pode nos levar ao não erro.
Por um
lado a Wicca é uma religião que resgata o culto à Deuses antigos e
esquecidos, cujo culto foi quase ou praticamente extinto. Os Deuses
africanos possuem ainda seus sacerdotes, sua liturgia, sua
religiosidade praticamente intacta.
Em
contrapartida a isto, é de comum senso entre os Bruxos cultuar os
Deuses de sua Terra e aqueles que fizeram de nossa Terra a sua morada
e nesta categoria entram os Deuses africanos.
Deuses
são arquétipos. Quando eu estou trabalhando com a energia do amor
eu posso utilizar uma Deusa de qualquer panteão que represente o
arquétipo do amor. Ela pode ser Afrodite, Frigg, Hathor, Vênus,
Inanna, Oxum e por ai vai...
Se eu
fizer um ritual wiccaniano para Oxum pedindo amor, tudo bem, não tem
nada demais nisso, pois estou apenas usando o nome, o conceito, o
arquétipo que esta divindade representa.
Agora, se
eu fizer um ritual para Oxum, mas nele tocar atabaque, fazer uma
oferenda de omolocum (uma comida feita com feijão fradinho, alimento
sagrado de Oxum no Candomblé), incorporar Oxum durante o decorrer do
ritual ai reside o problema por que eu não estarei praticando Wicca
e sim a maior Wiccumba. Aliás como muito bem lembrou o Mário, tá
cheio de gente fazendo isso por ai e se passando por grande Bruxa(o).
Acredito
que quem quiser trabalhar com Deuses Africanos assim pode proceder,
desde que esqueça TOTALMENTE todo o misticismo e aura que a religião
Afro-brasileira criou ao redor destes Deuses durante tanto tempo.
Isso
significa que se você quer fazer um ritual para Iyemanjá, precisa
esquecer aquela estátua linda - porém completamente infiel a
realidade - de uma mulher de longos cabelos, alva como a neve, com
pérolas caindo de sua mão, vestida de azul ou que você é filha de
Iyemanjá por que o Caboclo "Treme-Treme" disse que assim
era...e por ai vai...
Arquetipicamente
falando, Iyemanjá é o poder fertilizador e germinador da água, um
arquétipo muito antigo da Deusa Mãe como a Criadora de tudo, o
início do mundo, o mar primordial do qual surgiram tudo e todos.
Seus peixes simbolizam o embrião e as infinitas possibilidades da
água que gera. Como o mar ela é a fluidez e constante renovação,
a grande força geradora feminina, o princípio de tudo. Iyemanjá é
tanto o mar que alimenta, quanto devora. Ela é a profundeza do
inconsciente e tudo o que é cíclico.
Se vc vê
Iyemanjá assim, de uma forma totalmente desvinculada dos estigmas da
religiosidade Afro-brasileira, ótimo, você está apto à trabalhar
com ela wiccanianamente falando.
Se não,
ESQUEÇA, por que você não estará querendo trabalhar com a Deusa
em sua face de Criadora, germinadora mas sim com a Iyemanjá que você
conheceu lá no Candomblé ou Umbanda, uma Iyemanjá inexistente
dentro dos conceitos e padrões Wiccanianos de Divindades.
Preste
bem atenção:
O que
você quer? Praticar Wicca utilizando o conceito arquetípico de uma
Deusa ou Deus africano ou fazer uma mistureba entre a religiosidade
afro-brasileira e a Arte e chamar isso de Wicca?
Atente-se
por que se não você correrá um grande risco de não ser fiel a
religião que escolheu e se for assim é melhor procurar uma boa roça
de candomblé e se iniciar nos mistérios daquela religião.
Digam sim
ao trabalho arquetípico com os Deuses Africanos e NÃO à
Wiccumba!!!!
(Texto de
Claudiney Prieto)